segunda-feira, 18 de julho de 2011

Carta Filosófica 01

O tempo é como uma nave
desgovernada viajando a pleno breu,
levando a bordo,
a refém humanidade.

AS LEMBRANÇAS submergem nas águas do esquecimento, os desejos se vão no repetido caminho do costume, o encanto se perde no encontro com a descoberta, o interesse se torna honorário habitante do lugar comum, a saudade adormece na ante-sala da espera, a atenção se deixa roubar pelos entes que passam em sombras como silhueta na janela, a vontade de se ver, antes traduzida em aflição, hoje se vê sucumbida pela tela fria da televisão. Os ponteiros, em sua lentidão gélida, não marcam mais a demora do tempo, são braços mecânicos, números agônicos a interromper o fluir da emoção, prenunciam o beijo rápido da despedida – as horas passam a ser a senhora que determina o tempo da paixão-. Os olhos sem brilho emudecem e já não dizem mais, escondem sua fala no silêncio da boca que se cala para o afrouxado abraço condenado à extinção. O encontro não é mais tão aguardado, desinteressado, o estar junto torna-se então, apenas um não estar só...

No tempo, quase tudo se perde, só não se perde a esperança de que o tempo não seja o suficiente para tomar de nós o que em verdade se sente, mesmo que o outro esteja diacrônicamente ausente.

Setembro, de 1999

Westerley